Desigualdade Social

Desde a Revolução Francesa, no século XVIII, três palavras ganharam destaque nas discussões políticas: igualdade, liberdade e fraternidade. No entanto, enquanto objetivos para uma sociedade melhor, nenhuma delas foi plenamente alcançada.

Fraternidade é sinônimo de solidariedade e envolve empatia, a capacidade de sentir o sofrimento ou a alegria alheios, se colocando no lugar de outra pessoa; algo que nem todo ser humano tem ou deseja manifestar. Depende de um longo processo de educação e amadurecimento social.

Liberdade é quase um anseio utópico já que, para funcionar adequadamente em sociedades complexas, todo direito individual termina onde começa o alheio. Em outras palavras, sempre há regras a serem cumpridas e, desta forma, a liberdade referida é apenas parcial.

Igualdade tem um problema similar à liberdade. As sociedades capitalistas não foram cunhadas para a igualdade, mas para a desigualdade baseada no mérito subjetivo. De outro lado, o modelo comunista, pensado para a igualdade, apenas criou o famoso lema “alguns são mais iguais que os outros”.

Como este último ponto é o nosso tema, nos atemos a ele com uma pergunta inicial: você é sempre a favor da igualdade? Ou acha que existem casos e casos, cada um devendo ser analisado em separado?

Na antropologia brasileira, existe uma metáfora antiga que explica, a partir do entendimento de nosso comportamento cotidiano, como surge a Desigualdade Social, em seu nível mais básico. Vamos discuti-la brevemente.

significado de desigualdade social

Sistema de transporte público: a metáfora perfeita

Digamos que você esteja cansado do trabalho, tentando chegar em casa. Sua única vantagem sobre o demais cidadãos é que trabalha perto do ponto final da linha de ônibus. Como todos desembarcam e, por sorte, há poucas pessoas que utilizam aquela linha na região, você tem um lugar sentado garantido.

Durante o início do trajeto, tudo corre tranquilamente, mas, algumas paradas adiante, já não há mais bancos disponíveis. Nos próximos pontos, seu ônibus atravessará o centro da cidade e haverá muito mais gente querendo pegar a condução do que é possível ao veículo transportar.


De início, as pessoas que ficam em pé ainda têm um espaço razoável e fora o incômodo delas próprias, você não se importa muito com a situação. Porém, conforme entram mais e mais pessoas, sua situação também piora. Uma senhora passa batendo sacolas na sua cabeça, um cidadão oprimido pela quantidade de pessoas invade seu espaço e, mesmo assim, mais pessoas continuam entrando.

Você foi o primeiro, o pioneiro, aquele ônibus era seu, mas, agora, o espaço virou terra de ninguém e de todos ao mesmo tempo. Não há ordem possível e, cada um, espremido naquele espaço, se agarra ao pouco que consegue, ao ponto de algumas pessoas fingirem que estão dormindo para não ceder lugar a idosos ou gestantes.

Nossa reação pode muito bem ser a de odiar aquelas pessoas, ao invés de odiar o próprio sistema de transporte público, que não funciona. Além disso, o que permitiu a você viajar sentado, não foi o mérito, apenas uma coincidência fortuita. Mesmo assim, do seu ponto de vista, aquelas pessoas estão invadindo seu território e complicando sua vida.

Desigualdade social: da sociologia para a nossa percepção cotidiana

O exemplo anterior pode parecer muito simplista, mas, explica muito bem uma das formas como pode se manifestar a desigualdade social. Raciocine com calma, e irá perceber que este tipo de comportamento se repete em inúmeras situações sociais. Filas de banco, grandes eventos sem lugares marcados, até mesmo na fila do bandejão da universidade.

Contudo, estes são exemplos de desigualdade social de tipo genérico. Embora expliquem parcialmente as causas da desigualdade social, precisamos entender as várias formas que ela assume nas sociedades contemporâneas. Justamente por isso, vamos tentar dividir o tema em duas grandes áreas.

Veja também o significado de Sociologia.

1.Desigualdade econômica: certamente a primeira que vem à mente de todos nós. Afinal, se você tivesse um emprego melhor no exemplo acima, teria um carro e, assim, não precisaria do sistema público de transporte. Ao contrário, talvez passasse a ver os ônibus como um problema, já que tem preferência nas vias públicas, atrapalhando seu deslocamento.

Por isso perguntamos se o leitor é a favor da igualdade em qualquer situação. Em princípio, não deveria fazer diferença se deslocar de ônibus, de carro, de bicicleta ou mesmo a pé. Mas, a sociedade é desigual mesmo sem considerarmos os extremos.

Entre os que se deslocam de helicóptero e os que estão à margem da sociedade, na extrema pobreza, existem inúmeras camadas, cada uma delas tão preocupada em ascender ao próximo nível, quanto em impedir que tomem o seu lugar na pirâmide social.

O combate a este tipo de desigualdade está na agenda internacional, envolvendo esforços de diversos governos pelo mundo. Entretanto, excetuando umas poucas tentativas com programas de distribuição de renda, como o Bolsa Família brasileiro, não há, ainda, uma resposta realmente eficaz para o problema a longo prazo.

2.Desigualdade étnica e de gênero: são dois tipos bem diversos em suas manifestações, mas, em essência, ambos se constituem por um desrespeito ao outro, com base em motivos geográficos, físicos ou biológicos. Talvez seja a forma mais antiga de desigualdade social no mundo.

Não envolve apenas cor de pele ou identidade sexual. O conceito de etnia, por exemplo, vai além disso, incluindo aqueles que são estranhos à uma determinada cultura, assim como os romanos consideravam bárbaros todos aqueles que não compartilhavam seus costumes, suas práticas religiosas, seu estilo de vida.

Ou ainda, como foi possível aos europeus colonizadores ter sua prática escravista baseada na cor da pele, justificada até mesmo por parte importante da Igreja Católica da época. Não que a ausência da benção da igreja pudesse impedir a escravidão.

É preciso pensar a religião como parte da sociedade em que está inserida, pois é fruto dela, desta forma, os próprios religiosos imbuídos de uma percepção de mundo, que incluía a “inferioridade” de algumas “raças” em relação a outras.

Pior ainda quando tratamos da questão feminina. A desigualdade entre homens e mulheres é tão antiga, está tão entranhada na sociedade, que sequer é possível tratar do tema dentro de outro. Precisaríamos falar apenas disso e ainda faltaria espaço. Mas, podemos dizer que essa desigualdade foi sendo construída pelo próprio pensamento dito científico, ao longo da nossa história.

Assim como a desigualdade econômica, ainda não temos uma resposta eficaz para o problema a longo prazo, tanto que a escravidão acabou há quase duzentos anos, mas os negros continuam sofrendo com a discriminação racial e social, o que leva a uma condição de desigualdade. Mas, para encerrar, vamos nos ater ao caso brasileiro.

Desigualdade social no Brasil

Haveriam várias outras formas de se exemplificar o que é desigualdade social, mas nada representa melhor esta realidade social do que seu aspecto econômico. A discriminação racial, de gênero ou social, de forma abrangente, acabam sempre redundando em piores condições de vida para as pessoas que são o alvo.

O Brasil é certamente um dos melhores exemplos de como acontece a transformação da desigualdade social em uma desigualdade especificamente econômica. Nossa sociedade é desigual em todos os sentidos e isso se reflete nas oportunidades que temos ao longo da vida. Pense na dificuldade que qualquer jovem de periferia pobre tem para escapar das armadilhas da criminalidade.

Pense na quantidade de vezes em que é parado pela polícia, apenas por ser pobre ou negro, por ter um certo tipo físico. Neste ponto, algum leitor pode pensar: pessoas direitas se viram e conseguem. Pode ser, mas seria mais simples conseguir com as mesmas oportunidades que os demais. Ainda que jovens de classe média, ou mesmo ricos, eventualmente também se percam, eles partem com uma certa vantagem.

Em outras palavras, o fato de um punhado deles se perderem por caminhos divergentes não altera o fato da desigualdade social. Nem mesmo altera a estatística mais básica, de que a maioria acaba levando uma vida considerada “normal” – um termo em si mesmo extremamente discutível.

De qualquer forma, para falar em números, o Brasil aparece nos levantamentos da ONU (Organização das Nações Unidas), como o décimo mais desigual do planeta. Isso, em um índice que considera os aspectos econômicos e sociais. Nossa tarefa para o futuro é bastante difícil e ainda passa por uma conscientização geral da população, sobretudo no quesito da discriminação social.

Desigualdade social: única conclusão possível

Quando os iluministas franceses pregaram a igualdade entre os seres humanos, o que tinham em mente era praticamente impossível, uma igualdade abstrata para um tempo de agruras muito concretas. De lá para cá, a situação geral melhorou e isto é inegável, mas também é preciso circunscrever mais adequadamente o termo igualdade.

Hoje, não tratamos mais de tornar todos os seres humanos literalmente iguais. A realidade nos dita como objetivo possível, a igualdade de condições, ou seja, que sejamos iguais na diferença, que possamos todos ter uma vida de qualidade, tanto acima de certos padrões mínimos de dignidade, quanto possível.

Basicamente, não podemos ser contra algumas palavras muito modernas, como a meritocracia, que pressupõe um certo nível de desigualdade entre os seres humanos. Mas, também não podemos ser insensíveis à condição humana. Como demonstram vários relatórios e estudos da ONU, pobreza e desigualdade social custam muito caro a longo prazo.

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