Gastos com a saúde pública e educação

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Independentemente da região do Brasil em que vivemos, um sentimento é comum a todos nós: saúde, segurança e educação são fundamentais. Todos nós também acreditamos que estas áreas são de responsabilidade do Estado.

Mesmo que não achássemos isso, a Constituição Federal determina que assim seja. Outro ponto que todos temos em comum: achamos que os governos federal, estadual e municipal, não estão fazendo seu trabalho direito.

Entre estas três áreas, é difícil estabelecer o que mais nos incomoda, mas vamos nos arriscar a dizer que a saúde pública deve estar em primeiro lugar na lista da maioria dos brasileiros. Não apenas porque funciona mal, mas principalmente porque pessoas mortas não precisam de segurança, nem de educação.

gastos com saúde pública e educação

Em outras palavras, o cidadão precisa primeiro estar vivo e com saúde para depois se preocupar com a violência ou com a educação. Mas vamos ainda um pouco além.

Para a maioria das pessoas, há pouco que se possa fazer quanto à segurança pública. É claro que é possível ingressar na política, fazer concurso para juiz, promotor ou policial e tentar mudar a realidade, mas para ser bem sucedido nestas áreas, é preciso estudar e muito. Mais ainda, se realmente quiser melhorar a vida da população.

Justamente porque, quando visto por dentro, por quem trabalha nestas áreas, o sistema se mostra bastante resistente a mudanças. Como a discussão é longa, vamos começar tentando entender se o governo realmente não está fazendo seu trabalho de forma correta.

Quanto um governo investe em saúde e educação?

Desde que as Nações Unidas se tornaram uma realidade, saúde e educação sempre estiveram entre suas principais preocupações. Em função disto, ano a ano, vários relatórios são divulgados contendo dados que procuram apontar se as diversas populações têm acesso ao serviço e qual a qualidade do mesmo.

Uma das medições mais simples consiste em apontar quanto é gasto em saúde, ou quanto é gasto em educação em cada país do mundo. Mas, aqui cabe uma primeira distinção muito importante: gastar e investir são duas coisas completamente diferentes.

Salários de médicos e professores não são investimentos, são custos da operação. Cursos de aperfeiçoamento são investimentos. Consertar o telhado de um colégio não é investimento, é apenas manutenção e, portanto, custo. Construir uma escola é um investimento no início, depois, quando já está funcionando, se torna custo.

Os gastos de um governo, portanto, seriam a soma dos custos operacionais mais o investimento realizado. Em outras palavras, olhar apenas o montante de dinheiro que um governo emprega em seus serviços públicos diz muito pouco. Por outro lado, serve, pelo menos, de indício comparativo. Vamos observar um destes comparativos.

PIB: saúde e educação

A primeira referência que temos é a relação entre o PIB (Produto Interno Bruto) e o gasto total por área, isto é, quanto o país gasta, não apenas o governo. Neste quesito, os dados mais recentes e confiáveis são do levantamento da OMS (Organização Mundial da Saúde) de 2013.

Considerando apenas o gasto total, o Brasil está relativamente bem colocado, com cerca de 9% do PIB, dentro da média de países com bons serviços públicos de saúde. Porém, quando retiramos os gastos privados da conta, a história muda.

O governo brasileiro arca com apenas 47% dos gastos totais, embora o SUS (Sistema Único de Saúde) atenda a mais de 75% da população. Para esclarecer: constitucionalmente, o SUS é responsável por todos os cidadãos. Mas, cerca de 25% da população, utiliza o sistema privado. Vamos repetir assim:

O sistema privado gasta 53% do total para atender 25% da população.

O sistema público gasta 47% do total para atender 75% da população.

Mesmo que não sirva como um indicador direto de qualidade, este dado aponta para um gasto público muito baixo. Na maioria dos países desenvolvidos, o gasto público está em torno de 80% do total. Mesmo em países que não têm nada parecido com o SUS, como os Estados Unidos, o gasto público está nesta mesma faixa.

Além disso, agora considerando somente o setor público, não são apenas os gastos com saúde no mundo desenvolvido que estão acima da realidade brasileira, nossos vizinhos também gastam mais.

Gasto público com saúde no brasil: comparação per capita

Uma forma de refinar estes dados é dividindo os gastos pela quantidade de habitantes do país, o chamado valor per capita (por cabeça). A percepção melhora porque não há relação direta entre PIB e população. Inglaterra e Brasil, por exemplo, têm PIB parecido, respectivamente 2 trilhões de dólares e 1,8 trilhão de dólares. Porém, a população inglesa é de 50 milhões, enquanto a brasileira é de pouco mais de 200 milhões.

Em outras palavras, se ambos gastaram cerca de 10% do PIB em 2013, este número dá uma impressão falsa de igualdade de condições. Dividindo pela população, entretanto, a diferença é gritante. Os gastos totais aproximados seriam de US$ 4000,00 per capita na Inglaterra e de US$ 1000,00 per capita no Brasil. Comparando apenas os gastos públicos, teríamos algo como US$ 3200,00 e US$ 470,00.

Para piorar, podemos comparar com os gastos públicos em saúde de países mais próximos da nossa realidade, como o Panamá, que gasta US$ 853,00 anuais per capita; a Argentina, com US$ 851,00 per capita; a Costa Rica, com US$ 825,00 ou o Uruguai, com US$ 740,00 anuais per capita.

Não há por onde fugir, de qualquer ponto de observação, fica muito claro que os gastos com saúde do governo federal, estadual e municipal, mesmo que somados aos gastos do capital privado, ainda estão muito abaixo do necessário. E sequer tocamos em temas espinhosos como os desvios de verbas, desperdícios, entre outros.

Desta forma, nosso problema não chega a ser falta de investimentos em saúde no Brasil. Estamos precisando mesmo é gastar mais e, é claro, enquanto isso não acontece, gastar melhor o pouco que temos. Mas, vamos observar estes mesmos indicadores na área educacional.

Gastos com educação no Brasil

Apenas um esclarecimento antes de começarmos. Quando tratamos deste tipo de dados econômicos, os dados mais recentes do ano corrente ou do ano anterior nunca são confiáveis. Os orçamentos da União, dos estados e municípios são extremamente complexos, os gastos reais só podem ser verificados e confirmados alguns anos depois daquele em que ocorreram.

Dito isso, mais uma vez, considerando apenas a relação entre o PIB e os gastos totais, o Brasil está na média dos principais países do mundo. E mais uma vez, comparando o gasto per capita, está abaixo dos mesmos países, porém, a desigualdade não é tão grande na média.

Um dos principais problemas, entretanto, é o desequilíbrio da distribuição dos fundos entre a educação básica e a educação superior. De forma geral, os gastos em educação vêm subindo constantemente no país desde a estabilização da moeda nos anos 1990.

No entanto, aumentaram sem corrigir uma desproporção histórica. Para esclarecer este ponto, os dados mais confiáveis apontam que o Brasil gasta, em média, por aluno da rede pública, pouco mais de US$ 4300,00 anuais per capita.

Um primeiro ponto de destaque é que, comparado aos números da saúde, US$ 4300,00 parece um valor bastante elevado. Mas é preciso lembrar que o usuário médio do SUS não está todos os dias no posto de saúde ou no hospital. O aluno médio da educação, por outo lado, está todos os dias na escola, no colégio ou na universidade.

O sistema educacional é muito maior que o sistema de saúde, não apenas no Brasil, mas no mundo inteiro. Caso duvide desta informação, conte quantas escolas, colégios e universidades a sua cidade tem e depois, faça o mesmo com os postos de saúde e hospitais.

Além disso, por mais elevado que pareça, este é um valor médio. Quando separamos o gasto entre educação básica e educação superior, temos um abismo. Dados de 2008 da UNESCO apontam que, para cada US$ 1,00 gasto na educação básica por aluno, o triplo é gasto na educação superior.

O país continente e as dificuldades com os números

As diferenças reais podem ser ainda maiores, por dois problemas básicos. Primeiro, o orçamento da educação, assim como o da saúde, é fatiado entre os governos federal, estadual e municipal. Todas as três instâncias são obrigadas a gastar um percentual de sua arrecadação nestas áreas.

A partir desta obrigação inicial, temos vários problemas. Primeiro: as arrecadações variam de um ano a outro e, mais importante, variam de município a município, estado a estado, de acordo com a força de suas economias. Segundo: o gasto mínimo é obrigatório, mas é preciso que os tesouros municipal, estadual e federal, estejam saudáveis, pois muitos municípios e estados estão literalmente quebrados, como é o caso atual do Rio de Janeiro.

Sem maiores aprofundamentos, podemos dizer que não existe uma medida que valha para todo o país. Justamente por este motivo, os números veiculados pela imprensa nem sempre são confiáveis. E mesmo os dados das organizações internacionais são prejudicados pelas diferenças regionais e circunstanciais.

O que se sabe, com razoável grau de certeza, é que o país praticamente erradicou o analfabetismo entre a população jovem na última década. Também melhorou seus números gerais ao combater a evasão escolar e implementar programas de financiamento educacional e estudantil, permitindo um maior acesso às universidades.

Mas, boa parte destes números depende do crescimento econômico do país, porque os gastos estão atrelados às receitas governamentais. Nas recentes discussões em torno da crise econômica, por exemplo, a linha majoritária de raciocínio tende ao corte ou congelamento de gastos. Por este caminho, as poucas conquistas da educação podem se perder. As ínfimas conquistas da saúde nem é preciso dizer.