Golpe de Estado

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O Golpe de Estado ocorre quando um governo constitucionalmente legítimo é derrubado de forma repentina e ilegal, desrespeitando os processos democráticos, caso da eleição direta, por exemplo, e as leis do país. Nem sempre o golpe de estado recorre ao uso da força, embora na história de muitos países, em especial do Brasil e alguns da América Latina, os militares tenham participado e aplicado a violência com o objetivo de remover o poder constituído e instaurar um governo militar.

O conceito de golpe de estado está baseado nos paradigmas definidos a partir do Iluminismo e da Revolução Francesa (1789), em que o controle do Estado passa subitamente das mãos de um governo eleito para outra pessoa ou grupo. Essa ruptura institucional era conhecida até então como revolução, que hoje se reconhece mais quando ocorrem transformações profundas executadas com alta participação popular.

o que é golpe de estado

Para compreender, então, o que é um golpe de estado, é necessário entender que ele se dá quando ocorre a ruptura de um governo democraticamente eleito para a assunção de outro instado por um grupo político diverso, com apoio de setores econômicos, militares e até mesmo populares. Pode ser aplicado por uma maioria ou por uma minoria, dependendo do caso.

Golpe de Estado de Napoleão

O primeiro golpe de estado considerado como tal é o chamado Golpe 18 de Brumário, realizado pelo general Napoleão Bonaparte para consolidar seu poderio na França pós-revolução. A vitória de Bonaparte marcou a consolidação da burguesia como o setor mais poderoso do país após a derrubada da monarquia absolutista francesa e o breve período revolucionário.

Se chama Brumário pelo simples fato de que, no calendário revolucionário francês, a data do golpe foi no 18 de Brumário do ano IV, o que corresponde ao 9 de novembro de 1799 do calendário gregoriano.

A França revolucionária vivia forte pressão externa, com os monarcas europeus, liderados pelo clã Habsburgo e pela Rússia, para acabar com a revolução. Além disso, grassavam conspirações à direita e à esquerda para tomar o poder. Nesse cenário, Napoleão, um general com forte penetração junto ao exército francês, foi ganhando espaço dentro do governo revolucionário. Mas ele precisava de suporte para completar o golpe.

Então, de quem Napoleão recebeu apoio para desfechar esse golpe?  O general se valeu de um crescente apoio da burguesia, que clamava por um governo forte para ordenar e pacificar o país, ao mesmo tempo em que pudesse se defender das investidas estrangeiras. Eles, inclusive, sugeriram o uso da força militar para consolidar a tomada do poder por parte de Napoleão e dar início à instauração de um novo regime, que duraria até 1815, quando houve a queda de Napoleão após a derrota na batalha de Waterloo.

Golpes de Estado no mundo

Os golpes de estado no mundo são inúmeros e dariam uma lista enorme, com nomes como Tailândia, Paquistão, Egito, Sudão, Tchecoslováquia. O mesmo vale para a América Latina. Um dos mais famosos na região é o golpe militar no Chile, de 1973. Na ocasião, após meses de um enorme sufocamento econômico no país por setores da economia insatisfeitos com o governo de viés socialista de Salvador Allende, um grupo de militares, apoiados por setores da sociedade chilena, aplicaram o golpe contra o governo eleito. Como ato final, o palácio presidencial La Moneda foi bombardeado pela força aérea nacional e o mandatário acabou morto. Assumiu, então, o general Augusto Pinochet, que governou com mão de ferro até 1990.

Na segunda metade do século XX, diversos golpes de estado ocorreram na América Latina, casos do Uruguai, Paraguai, Brasil, Bolívia, Nicarágua, Guatemala, entre outros. Um golpe de estado mais recente foi o ocorrido em Honduras em 2009. Na ocasião, os militares cumpriram um mandado de prisão do Poder Judiciário e prenderam o presidente Manuel Zelaya, pois ele estaria tentando mudar as regras eleitorais para se reeleger. Em seu lugar assumiu o presidente do Congresso, Roberto Micheletti.

Há casos em que o discurso é divergente: alguns creem em golpe, outros refutam essa ideia. É o caso da destituição de Fernando Lugo da Presidência do Paraguai em 2012. Acusado de ser culpado em um conflito entre policiais e camponeses em uma reintegração de posse que matou 17 pessoas, Lugo foi destituído em 24 horas, em um processo de impeachment rápido e praticamente sem espaço para defesa. Apesar de ter sido considerado legítimo pelo Tribunal Superior Eleitoral paraguaio, foi visto como ilegal e ilegítimo pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, provocando inclusive uma crise diplomática com o Mercosul e a Unasul.

Golpe de Estado no Brasil

Golpe de estado no Brasil também é algo recorrente, em especial na história recente do país. O golpe do Estado Novo, por exemplo, anunciado em 1937 em rede nacional de rádio pelo então presidente Getúlio Vargas, implantou um governo de exceção que durou até 1945. Eleições diretas para presidente estavam marcadas para 1938, e com proibição de que Getúlio se candidatasse à reeleição. Em meio a isso, o país vivia grande instabilidade política, com grupos lutando pelo poder em meio a um cenário internacional pré-Segunda Guerra e de crescimento do nazismo e do fascismo, teses nas quais Getúlio simpatizava.

Com um poder Executivo mais central, franca aliança com setores militares e apoio das oligarquias nacionais, Getúlio empreendeu o golpe de estado para permanecer no poder, instaurando um dos períodos mais autoritários vividos no Brasil. A justificativa do golpe de estado de Getúlio Vargas era que havia um complô comunista que ameaçava o país. Depois viu-se que se essa tese tratava de uma farsa para justificar o golpe.

Mesmo após o término do Estado Novo, o Brasil viveu inúmeras tentativas de golpes e contragolpes, em um período democrático que duraria apenas até o início dos anos 1960. O golpe de estado de 1964 foi o auge na América Latina de deposição de governo populares, vistos como contra os interesses das burguesias nacionais e dos Estados Unidos, em um cenário de Guerra Fria em que os EUA disputavam com a União Soviética seu espaço pela liderança do mundo.

Nesse cenário, o presidente João Goulart, que assumira no lugar de Jânio Quadros que havia renunciado, era visto como perigoso por se simpatizar com o regime de Fidel Castro em Cuba, por ter uma política externa independente dos EUA e ter nacionalizado uma empresa de petróleo norte-americana. Com políticas de viés mais social, Goulart desagradou inúmeros setores econômicos da elite brasileira, que apoiou a movimentação militar. Com isso, ocorreu golpe militar que depôs Goulart e instaurou a ditadura, que duraria até 1985, com inúmeras ações autoritárias, tais como:

  • Restrição de direitos políticos;
  • Extinção dos partidos políticos;
  • Fim da liberdade de expressão;
  • Censura, tortura, sequestros e desaparecimentos de pessoas;
  • Fim das eleições diretas para presidente;
  • Fechamento do Congresso Nacional em várias oportunidades.

Ruptura institucional e golpe no século XXI

Muito tem se falado a respeito do processo de impeachment que destituiu a então presidenta da República Dilma Rousseff em 2016 do poder como um golpe de estado. Há argumentos que apontam a favor e outros indicam que não se tratou de um golpe:

Posição a favor da tese do golpe

  • Sem crime de responsabilidade: um argumento favorável à tese do golpe de estado 2016 é de que o processo de impeachment seria injusto, pois não foi comprovado contra Dilma nenhum crime de responsabilidade que justificaria o impeachment. Além disso, o processo seria uma forma de conspiração contra o governo petista por parte de setores da oposição e de parte de grupos aliados.
  • Manifestações não valem: outro ponto observado pelo entendimento que se tratou de golpismo é que as manifestações populares e a baixa popularidade de um mandatário não são justificativas para depor um presidente eleito democraticamente. Que, mesmo com cerca de 6 milhões tendo ido às ruas, as regras democráticas que elegeram Dilma Rousseff com 54 milhões de votos deveriam ter sido respeitadas.
  • Justiça seletiva: por último, os defensores da tese do golpe afirmam que o Judiciário tem sido ator importante para dar um aspecto legal à ruptura democrática, pois a Operação Lava-Jato estaria investigando e condenando de maneira seletiva, priorizando membros do antigo governo e poupando opositores.

Posição contra a tese do golpe

  • Houve crime de responsabilidade: do lado dos que defendem que não houve golpe, há a análise de que as ações contra o governo de Dilma ocorreram dentro da legalidade, pois o impeachment está na Constituição Federal de 1988 para retirar governos incompetentes e corruptos. E que a presidente Dilma praticou atos que lesaram o país por meio das pedaladas fiscais – atraso no repasse de verba a bancos públicos para amenizar a situação fiscal do governo.
  • Manifestações causadas por erros de Dilma: o segundo argumento que refuta o advento do golpe é que a razão para que milhões tenham ido às ruas foi resultado de uma grave crise econômica desencadeada por inúmeros erros do governo de Dilma Rousseff que geraram uma enorme insatisfação popular.
  • Justiça está funcionando: já a avaliação de que a Operação Lava-Jato estaria atuando apenas contra personagens petistas, poupando opositores, não se sustentaria para os que são contra a ideia de golpe. Eles dizem que a Justiça tem agido dentro da normalidade e que até o momento nenhuma ilegalidade teria sido comprovada, embora muitos políticos investigados e com sérias suspeitas e indícios de atos ilícitos tenham sido soltos recentemente.

Como se vê, os discursos são diversos e somente o tempo e a História irão dizer melhor a respeito desse inegável processo de crise institucional e política que o Brasil tem passado nos últimos anos.