Movimento Indígena

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Os povos indígenas do Brasil, formados pelos indivíduos (e descendentes desses indivíduos) que já habitavam o que hoje é o território da República Federativa do Brasil antes da chegada dos colonizadores europeus, acabaram reduzidos ou eliminados pela violência dos colonizadores, pelas doenças trazidas por eles e pela destruição de suas sociedades.

o que são movimentos indígenas

Foram subjugados, escravizados ou expulsos das terras em que viviam ou colocados à margem ou na periferia da sociedade que se foi desenvolvendo no território que hoje faz parte do país chamado Brasil e submetidos à destruição de suas culturas tradicionais. Com o passar do tempo, foram aparecendo defensores da causa dos índios contra as brutalidades e iniquidades praticadas contra eles pelo homem branco.

Um exemplo digno de nota foi Cândido Mariano da Silva Rondon, o Marechal Rondon que, inspirado pelos ideais do Positivismo, doutrina criada pelo filósofo francês Augusto Comte, que foi uma das inspirações para a Proclamação da República no Brasil, defendeu a causa dos índios e evitava, tanto quanto possível, em suas incursões (a serviço do projeto de ligação das cidades brasileiras pelos fios do telégrafo, a chamada Comissão Rondon) nos territórios por eles habitados confrontos com os nativos. “Morrer se preciso for, matar nunca”, pregava ele no que se referia aos contatos com índios muitas vezes hostis e desconfiados depois das iniquidades que haviam sofrido anteriormente. Interessantemente, o próprio Rondon tinha índios entre seus ancestrais.

A partir de 1908, Rondon passou a defender a criação de um órgão estatal de defesa dos índios que os ajudasse a gradualmente serem assimilados pela civilização brasileira dominante, fortalecendo neles antes a consciência de serem brasileiros e estabelecendo com eles relações amistosas. Em 1910, esse órgão foi criado, o Serviço de Proteção de Proteção aos Índios, subordinado ao Ministério da Agricultura que teve justamente Rondon como seu primeiro diretor.

Com a pequena amostra acima dos problemas que os índios enfrentavam (e enfrentam), das vozes que se levantaram em defesa deles contra seus agressores e das medidas que elas inspiraram, pode-se passar a uma pequena apresentação sobre o movimento indígena, ou seja, o movimento social em defesa dos índios e de seus interesses de autoria e iniciativa dos próprios índios.

Embora a luta contra a opressão se confunda com a própria história dos contato entre povos indígenas e os colonizadores (e seus descendentes) do continente americano, um dos principais marcos do movimento indígena – e também do indigenismo –  foi o primeiro Congresso Indigenista Americano (também conhecido como Convenção de Patzcuaro), que se reuniu no México no ano de 1940.

Desse evento histórico, participaram delegações de quase todos os países do continente, delegados independentes e mais de 40 representantes de grupos indígenas de vários países do continente. Entre os princípios afirmados na declaração aprovada pela Convenção estão a defesa da igualdade de direitos e oportunidades a todos os cidadãos independentemente de suas origens raciais e a defesa de medidas que, respeitando os valores e história dos povos indígenas, ajudem-nos a assimilar-se às sociedades junto às quais vivem e a tirar proveito das modernas tecnologias.

Além disso, foi estabelecido o dia 19 de abril como Dia do Aborígene Americano (no Brasil, conhecido como Dia do Índio). O primeiro Congresso Indigenista Americano foi também um marco do indigenismo, doutrina que surgiu primeiro no México em círculos intelectuais nacionalistas e defende a valorização e defesa das populações indígenas.

O Movimento Indígena no Brasil, seu histórico e seus desafios – passados e presentes

No Brasil, o movimento indígena começou a manifestar-se de forma mais organizada a partir da década de 1970. Entre os motores dessa organização estava a necessidade de defender as terras em que os índios viviam – e suas próprias vidas – das políticas expansionistas adotadas pelo regime, que deu prioridade à construção de obras em regiões de fronteira com o objetivo de desenvolvê-las economicamente e povoá-las, para tornar sua defesa contra interesses estrangeiros mais fácil (“integrar para não entregar”).

Embora a falta de registros impeça que se calcule exatamente o tamanho do estrago, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) estimou que mais de oito mil índios foram exterminados devido à construção de rodovias como a Transamazônica e a Perimetral Norte. A chegada das frentes de construção às terras dos indígenas, inclusive a terras de etnias que viviam isoladas, e a chegada de fazendeiros (muitas vezes em conluio com as autoridades) que demarcavam para si latifúndios nas terras em que viviam os índios representaram um desastre para dezenas de povos indígenas, alguns dos quais desapareceram totalmente ou tiveram suas populações radicalmente reduzidas. Muitos dos ataques aos povos indígenas durante o período da Ditadura Militar contaram com a participação de agentes públicos.

Uma das principais causas do movimento indígena é justamente a defesa das terras dos índios. Por isso, o movimento indígena defende a regularização das terras indígenas através do processo de demarcação, a intensificação das medidas de fiscalização das terras demarcadas, a ampliação das terras já demarcadas para que elas sejam suficientemente grandes para garantir a estabilidade das etnias nelas vivendo e permitir a permanência nesses espaços das famílias indígenas e o combate a empreendimentos que causem danos à natureza ou à vida das famílias que vivem nas aldeias. Um dos objetivos do movimento indígena é a revogação do Decreto No 1.775, de 8 de janeiro de 1996, por permitir a contestação das demarcações mesmo depois de sua homologação.

Além da defesa dos territórios habitados pelos índios contra investidas espoliadoras e das vidas e integridades físicas dos indígenas contra agressões, o movimento indígena também defende o direito dos índios de preservar suas culturas, seus modos de viver. Ademais, entende o movimento indígena que as circunstâncias dos povos indígenas exigem, da parte das autoridades, a elaboração de projetos socioeconômicos especiais, projetos diferenciados de saúde pública para o atendimento dos povos indígenas e cuidados especiais para que os índios possam ter acesso à educação.

Na década de 1980, foi eleito o primeiro deputado índio da história da Câmara dos Deputados, o cacique Mário Juruna, um índio do povo xavante nascido no Estado do Mato Grosso que havia se notabilizado na década anterior por sua luta em defesa das demarcações das terras indígenas e por gravar as promessas feitas pelas autoridades, que muitas vezes não eram cumpridas.

Mário Juruna foi eleito pelo estado do Rio de Janeiro na legenda do Partido Democrático Trabalhista (PDT) com pouco mais de três dezenas de milhares de votos. Uma de suas realizações na Câmara dos Deputados foi conseguir a criação da Comissão Permanente do Índio no Congresso Nacional, trazendo maior atenção das autoridades às questões e necessidades dos povos indígenas brasileiros. Juruna exerceu um mandato de deputado, não tendo conseguido se reeleger em 1986, e faleceu em 2002, aos 59 anos de idade. O corpo do ex-deputado, até hoje o único índio a ocupar uma cadeira parlamentar no Brasil, foi velado no Congresso Nacional.

Uma das principais vitórias do movimento indígena foi o reconhecimento pela Constituição Federal (artigo 231) aos povos indígenas de seus costumes, línguas e tradições e das terras que têm tradicionalmente ocupado. A União foi incumbida por esse artigo de demarcar essas terras e de proteger os bens desses povos. O artigo seguinte da Constituição Federal, de nº 323, afirma que os índios, suas organizações e suas comunidades têm direito de entrar com ação na Justiça para defender seus interesses e direitos. O mesmo artigo constitucional incumbe o Ministério Público de intervir em todos os atos desse processo.

Uma das questões mais polêmicas envolvendo o movimento indígena é o conflito que por vezes se dá entre povos indígenas e produtores rurais que invadem suas terras. Às vezes, o conflito se torna violento, podendo até mesmo causar mortes de um lado ou de outro (ou mesmo de ambos), contribuindo para a certeza de que há ainda muito por fazer no que se refere à demarcação de terras indígenas e proteção dos direitos dos índios sobre elas.

Outra polêmica intimamente associada com o movimento indígena é o recurso ocasional a formas de protesto e pressão sobre as autoridades públicas, tais como ocupações de prédios públicos, especialmente sedes de organizações ligadas à questão indígena como a FUNAI (Fundação Nacional do Índio), sucessora do Serviço de Proteção aos Índios. O movimento indígena também lança mão de instrumentos como a criação de Organizações Não-Governamentais (ONGs), colaborando no processo de elaboração de projetos de lei e comparecendo ao Congresso Nacional em dias de importantes votações envolvendo interesses dos índios para pressionar os parlamentares.

Como exemplo interessante de mobilização levada a cabo pelo movimento indígena, pode-se citar o fato de que, no ano de 2013, a Comissão de Professores e Professoras Indígenas de Pernambuco (Copipe) e lideranças dos povos articularam na capital do estado nordestino, Recife, mais especificamente no campus da Universidade Federal de Pernambuco, um encontro com centenas de participantes indígenas.

Entre os objetivos do evento, que contou com apresentações de caráter cultural, estava denunciar problemas na prestação de serviços públicos às comunidades indígenas, fazer reivindicações e denunciar as estratégias usadas por poderosos interesses econômicos e políticos para atacar os direitos dos povos indígenas. Segundo texto publicado pelo Conselho Indigenista Missionário, um órgão criado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, entre as características do movimento indígena no estado de Pernambuco está a capacidade articular as pautas relevantes no estado com as pautas de interesse dos povos indígenas de todo o Brasil.