Tráfico de influência

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O tráfico de influência é um termo bastante comum nos noticiários que informam a ocorrência de crimes relacionados à corrupção e improbidade administrativa. Cada vez mais o noticiário político coloca esse conjunto de palavras para abordar inúmeros crimes supostamente cometidos por funcionários públicos, políticos, empresários e muitos outros.

significado de tráfico de influência

No entanto, há muita confusão com os termos e sobre o que cada um significa, tendo diversas diferenças importantes que devem ser percebidas. Por isso, a pergunta: você sabe o que é tráfico de influência e como ele funciona? Qual a diferença entre corrupção ativa e tráfico de influência? Lobby é a mesma coisa que tráfico de influência? Neste artigo vamos explicar como ele se dá e também como as leis do Brasil interpretam esse crime e seus semelhantes, além de mostrar casos em que o tráfico de influência poderia ter ocorrido.

Tráfico de influência: o que é?

A tipificação de tráfico de influência se dá no art. 332 do Código Penal. Segundo a lei, tráfico de influência é “solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outra pessoa, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício de sua função”.

A palavra tráfico tem um significado muito forte no imaginário popular do Brasil, pois ela remete ao crime de tráfico de drogas, outra chaga da sociedade brasileira. Mas é possível fazer uma relação entre as duas coisas? Sim, vamos lá! Tráfico de drogas ocorre quando alguém que produz o entorpecente busca revendê-lo para uma outra pessoa, que possui os meios e o dinheiro para adquiri-lo. Esse processo se dá por meio de uma troca, em que o traficante oferece a droga e o comprador lhe dá o dinheiro para ter acesso àquele produto ilícito.

O que caracteriza o tráfico de influência leva em conta uma dinâmica bastante semelhante a esta. Neste caso, empresas ou mesmo entidades privadas de uma determinada área buscam vender seus produtos. Do outro lado, o público detém o interesse/necessidade e os meios para adquirir os produtos e serviços.

Ocorre que, quando algum representante de uma companhia qualquer se aproveita de sua posição para persuadir um funcionário público, por exemplo, para conceder alguma vantagem ou benefício a ele ou à sua empresa, trata-se de um crime. Outro exemplo é o tráfico de influência e exploração de prestígio, que abordaremos detalhadamente abaixo, mas remete a quando a pessoa usa de suas conexões com o alto escalação do governo para obter favores, viagens ou mesmo dinheiro.

Dentro deste ponto de vista, o tráfico de influência tem o sujeito ativo e passivo como participantes do crime. O ativo seria o ente privado que usa de sua posição para fazer com que sua organização obtenha alguma vantagem em conluio com o sujeito passivo, no caso, o Estado.

Vale ressaltar que o sujeito ativo não precisa nem mesmo ter obtido alguma vantagem de fato para a sua companhia. O fato de ele insinuar a intenção de conseguir alguma vantagem por meio de influência em relação a um agente público já caracteriza o tráfico de influência.

O tráfico de influência presente no art. 332 do Código Penal prevê prisão e dois a cinco anos, além de multa, a quem cometer esse tipo de crime. Essa pena poderá ser aumentada pela metade caso o autor do crime alegue que a vantagem obtida não se destinava apenas à sua organização, mas também ao funcionário público, geralmente em forma de propina.

Diferença entre tráfico de influência e outros crimes

Agora, se o autor do crime realmente possuir essa influência em relação ao agente público e se utilizar dela, o crime já muda e se torna corrupção ativa. Ou seja, tráfico de influência e corrupção ativa são coisas diferentes. Inclusive, corrupção ativa está destacada no art. 333 do Código Penal, um artigo depois do tráfico de influência.

Já a corrupção passiva, inscrita no art. 317, ocorre quando o agente público solicita ou mesmo ganha alguma vantagem indevida por conta de seu cargo ou posição que ocupa. Existe ainda uma variação da corrupção passiva que é a corrupção privilegiada, presente no inciso 2 do art. 317. Ela ocorre quando o agente público não tem como objetivo a obtenção de alguma vantagem. No entanto, ele pratica, deixa de realizar ou retarda alguma situação a pedido ou mesmo influência de um terceiro, incorrendo, assim, em um ato infracional.

Há ainda outra diferença. Caso o tráfico de influência ocorra no Poder Judiciário e avance de uma dita influência para uma influência consumada, em que o criminoso pede e obtém vantagem do juiz, funcionário da Justiça, membro do Ministério Público testemunhas etc., o crime será registrado como exploração de prestígio, que está previsto no art. 357 do Código Penal. A exploração de prestígio ocorre, de acordo com o que está subscrito na lei, quando a pessoa solicita ou recebe dinheiro ou qualquer outra utilidade, com o pretexto de influir um juiz, jurado, perito, tradutor, entre outros.

Outra semelhança que possui nuances que precisam estar indicadas para se perceber suas diferenças é entre o tráfico de influência e advocacia administrativa. Este crime está previsto no art. 321 do Código Penal e significa patrocinar, de forma direta ou indireta, o interesse privado em relação à administração pública, valendo-se do fato de ser um funcionário público. Aqui, como vemos, está o ponto de vista do outro lado do balcão, quando o agente público incentiva, cria, possibilita que o crime contra o erário ocorra em seu benefício.

Lobby é tráfico de influência?

No mundo, é comum a relação entre empresas e agentes públicos. Essas relações podem ser positivas ou nocivas para o funcionamento do Estado. Em geral, os lobistas são grupos profissionais, conhecidos e regulamentados, formados por pessoas que representam os interesses de instituições privadas e fazem o meio de campo dessas companhias com outras corporações, partidos políticos e com o próprio Estado. Nos Estados Unidos, por exemplo, trata-se de uma atividade permitida e muito comum no Congresso Nacional.

Enfim, o lobby é uma forma de exercer pressão na esfera política para que o poder público adote posições que beneficiem seus representados. Como se vê, lobby e tráfico de influência parecem ser a mesma coisa. Porém, não há nada na lei que tipifique o tráfico de influência no Brasil e tenha qualquer relação com o lobby. No Brasil, porém, essa prática não está regulamentada e não é autorizada pelo Estado.

A discussão em torno do lobby e sua relação com tráfico de influência e corrupção existe no Brasil. Recentemente, por exemplo, discutiu-se o assunto na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Há pensamentos favoráveis à prática do lobby, desvinculando-o de qualquer relação com o tráfico de influência e a corrupção, que são crimes comuns tipificados no Código Penal.

Do outro lado, advogados definem que o próprio lobby de terceiros – no lugar dos advogados – atuando em cima de juízes para conseguir favores em processos é uma forma mais suave de tráfico de influência. Há ainda a reflexão de que o tráfico de influência disfarçado de lobby é uma prática muito comum não só no Poder Judiciário, mas também em outras áreas.

O lobby não é tipificado como crime no país. Há cerca de 2 mil profissionais nessa área atuando no país atualmente, de acordo com dados da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig). Acredita-se que a regulamentação e a profissionalização dessa atividade ajudariam a impor limites e evitar a prática de crimes.

Casos de tráfico de influência no Brasil

Há inúmeros casos indicados como tráfico de influência no Brasil, alguns ainda em investigação, inclusive.

Um caso que está sendo analisado no momento é uma suposta relação de tráfico de influência entre Lula e a construtora Odebrecht. O Ministério Público Federal está investigando se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu, de fato, recursos da Odebrecht em palestras realizadas no exterior para que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) realizasse empréstimo para a companhia. Lula, por meio de entrevistas e pronunciamentos, tem reforçado que nunca interferiu nas decisões do BNDES e que é comum que ex-presidentes defendam interesses das empresas de seus países.

Outro episódio, mais antigo, remete ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, durante o ano de 1995, em uma sigilosa disputa de licitação para um contrato de R$ 1,4 bilhão com o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) para combater a devastação da região. Na ocasião, o chefe do cerimonial do então presidente FHC, Júlio César Gomes dos Santos, acabou sendo exonerado após suspeitas darem conta de que ele vendia sua influência em relação ao Planalto para beneficiar a empresa Raytheon, dos Estados Unidos. No entanto, a investigação acabou sendo arquivada por falta de provas.

A suspeita recaía sobre o governo, pois, apesar do sigilo para proteger a tecnologia adquirida pelo país, cópias da licitação foram enviadas a 16 embaixadas de Brasília. Além disso, um mês antes do término da licitação, o então presidente dos EUA, Bill Clinton, visitou o Brasil e se reuniu com FHC, deixando no ar essa situação.